Ousada, audaciosa e sedutora
- Por Nelson Correa
- 19 setembro, 2013
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O artigo no blog do Marcelo Rubens Paiva no Estadão mostrando velhos anúncios que colocam a mulher em uma posição de inferioridade inaceitável hoje, me remeteu à uma história que meu querido avô, inspiração desse blog, nos contava quando éramos pequenos. Vou contá-la:
Dizia ele que dois de seus amigos, portugueses e vascaínos como ele, um mais jovem e outro da sua idade, discutiam sobre a ausência de um deles, o jovem, recém casado, dos jogos do Vasco em São Januário. As suspeitas eram que estava sendo controlado pela nova esposa que não lhe permitia ir aos jogos do Gigante da Colina.
Em um papo entre eles, o mais experiente foi direto ao ponto e perguntou ao jovem amigo se o motivo da ausência dele do campo de futebol era por conta da esposa. Ele até entendia que antes isso fazia parte da nova vida do parceiro, afinal eram um casal de bodas recentes. Ele entendia o Clube de Regatas Vasco da Gama ficar em segundo plano. Mas bolas, já haviam comemorado o primeiro ano de casados. [se você conseguir, imagine o diálogo abaixo com sotaque de Portugal, que era como meu avô falava.]
– Abel, seja sincero com seus velhos amigos. O que tem te deixado longe dos jogos do Vasco ainda é a tua jovem esposa?
– Sim, seu Albino… é Lucinha a responsável.
Respondeu o torcedor ausente, deixando o copo de pingado no balcão da padaria Rainha do Minho e quase concomitantemente baixando o olhar perdido sob as mesas de pés de ferro e tampos de mármore.
– Abel, ainda não descobristes todos os segredos do casamento? Veja bem… não estou te pedindo inconfidências… sua vida com tua esposa é somente sua… me entendes onde quero chegar, não entendes?
– Seu Albino, não há mais segredos a serem descobertos na vida de casado. Assim penso eu.
– Então o que te prende em casa nas tardes de domingo, Abel?
– Lucinha não me permite ir ao Vasco, seu Abel. Me ameaça, chora, esperneia e eu arrependido, por diversas vezes voltei já na soleira da porta. Não sei o que fazer. Dona Ana lhe deixa ir ao Vasco sem questionamentos?
Balançando a cabeça para frente e com um sorriso travado nos lábios, o velho Albino entendeu logo a situação.
– Meu caro Abel, é certo que minha Ana já foi igual à tua Lucinha, mas aprendi a mudar-lhe o jeito de ser. Vou te ensinar. No domingo, ao almoço, quando Lucinha colocar a sopa na mesa, vire a sopeira e derrame toda a sopa e diga que vais ver o Vasco. Quando o prato principal vier, jogue-o longe e repitas que vais ao Vasco. Se ela reclamar, jogue a garrada de vinho longe e mais forte e alto digas que vais ao Vasco. Pegue o chapéu e vá em direção à porta. Caso ela te interrompa no caminho, pegue-a de bruços sobre as pernas e dê-lhe umas boas palmadas para mostrar quem manda em casa.
No domingo, tomado de extrema coragem, Abel colocou em prática a aula de seu Albino. Logo que a sopa veio para a mesa ele a derrubou sobre a toalha de linho branco. Lucinha chorou. Mas ele disse:
– HOJE VOU AO VASCO!
Veio o assado de carne com batatas coradas e Abel empurrou com travessa e tudo para fora da mesa. Quando Lucinha indignada ia falar ele berrou forte:
– HOJE VOU AO VASCO!!!!
Ela ameaçou iniciar seu discurso de todo domingo quando Abel estourou a garrafa de vinho na parede, pegou o chapéu e dirigiu-se à porta, ainda vociferando pelo caminho:
– HOJE VOU AO VASCO!!!!!!!!!!
Como previsto pelo velho Albino, Lucinha se interpôs entre ele e a porta e disse-lhe que ele não iria ao Vasco. Abel, quase vencedor e por isso confiante como nunca, agarra Lucinha pela cintura, senta-se em uma das cadeiras da sala, coloca-a de bruços sobre suas as pernas e levanta-lhe as saias para o gran finale: as palmadas.
Mas Lucinha estava “desprevenida”, ou seja, sem as calçolas. Com o braço levantado mirando o alvo das palmadas e pronto para encerrar a discussão mostrando quem mandava em casa, Abel murmura, quase gemendo:
– o…que…vou…fazer…no…vasco?
P.S. Lembro que nós, meninos ainda, perguntávamos ao vô Manoel se o Vasco tinha ganho o jogo. Ele dava de ombros e devia pensar que estava perdendo tempo contando aquelas histórias para nós. Tava não vô. A maioria delas, ou pelo menos fragmentos, estão vivíssimas até hoje. ;-)
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