New Orleans não pode ser só uma lembrança
- Por Nelson Correa
- 10 fevereiro, 2007
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Assim que pisei nos corredores simples, quase pobres se comparados com outros aeroportos dos Estados Unidos, do Louis Armstrong Airport, me encantei com seus murais representando a história e maior riqueza da cidade: seus grandes músicos e intérpretes do jazz. A primeira coisa que fiz quando tive a possiblidade de um contato imediato com uma nativa foi perguntar se ela era da cidade. Sim, ela era. E como você fala o nome da sua cidade? New Orleans. Niu Órleans.
Niu Orlíns falam os outros americanos, que até tem vergonha da cidade. Isso foi em 2001, e eu chegava para um Congresso. Aborrecido, ouvi de vários expositores o pedido de desculpas pela cidade. Deixei vários deles surpresos, quando respondia ao pedido de desculpas com a afirmação que era o melhor lugar dos Estados Unidos que já conhecera. Nova Iorque não é americana, é do mundo. ;-)
Estou com Nova Orleans na cabeça desde o domingo passado, quando li uma grande matéria, publicada no Estadão, sobre como tem definhado a cidade depois do furacão Katrina, quando 700 pessoas morreram. Do pouco caso do governo norte-americano com a reconstrução da cidade, pois foram destruídas 220.000 casas, e quase nada recuperado. Com a significativa redução da população, mais da metade foi embora, coisa na casa de 250.000 pessoas a menos. Maior taxa de homicídios dos EUA, com 73,5 assassinatos por 100.000 habitantes. Em 2004, tanto Rio de Janeiro (56,4 por 100 mil habitantes) quanto São Paulo (39,6) foram melhores que Nova Orleans. Pior só Vitória, com 79,1 assassinatos por 100 mil habitantes.
E ao publicar no Ouvir & Ler 16 o rock do Led Zeppelin, que foi blues, gravado pela primeira vez em 1929, e que conta a história da inundação de 1927 no Mississipi, me senti compelido a escrever sobre essa cidade que me encantou. Não só pelos pontos turísticos tradicionais como o French Quarter, os Beignets do Café du Monde, o Jazz em todo lugar, a culinária, ah… a culinária canjun e creole, o feijão com paio e louro. Ou então as excursões ao cemitério com tumbas com arte, como as nossas aqui no Brasil, afinal a origem latina está nos dois povos.
Todavia, não é a libertinagem pública do Mardi Gras que faz Niu Órleans única nos Estados Unidos. O que faz (ou será que já fazia?) essa cidade e seu povo (negros ou brancos) únicos naquele país, pode ser representado por uma situação que vivemos: na fila para comprar beignets (*), um morador puxa conversa e comenta a receita dessa iguaria da culinária local. Tanta abertura, só em Nova Orleans!
O ruim de quem viaja muito a trabalho, sozinho, é não ter com quem dividir as interjeições de felicidade ou espanto, ao conhecer novos povos, civilizações e cidades diferentes. Em Nova Orleans, foi diferente, a Cristina estava comigo.
(*) Beignets são como os nossos sonhos, com uma massa muito mais leve, que lembram os bolinhos de chuva feitos por nossas avós, com muito, mas muito mesmo, açúcar na consistência de talco. Ah, sim, eles acompanham com café com leite.
Ah, que saudade! Que cidade! Quantas similaridades com nosso sangue latino. O óbvio seria o Carnaval, claro, mas as coincidências culinárias eram muitas. Lembrei também do delicioso Bread Pudding , igual ao nosso, e dos pralines, nada mais nada menos do que o nosso mais do que conhecido pé-de-moleque.