Um telefonema especial

AtendenteSão Paulo, sexta-feira, 15:50h

Torcendo para chegar a tempo de pegar o banco na Av. Angélica aberto, lamentei parar no farol (sinal em carioquês) fechado da Rua Piauí, ao lado da praça Buenos Aires.

– Droga! Mas vai dar tempo. Só mais duas quadras (quarteirões em carioquês).

Nesse instante, vejo um cidadão de short e camiseta (ou estaria sem camisa?) se aproximar furtivamente, olhando em volta, e esconder uma faca (excessivamente grande para cortar laranjas, diga-se de passagem) sob a espuma onde dormia outro largado cidadão.

– Caramba. Que perigo! Aquele filho da puta não vai cortar laranja com aquela faca. E essa região é cheia de escolas e crianças. Tenho que avisar a polícia.

Verifiquei com exatidão o número em frente ao esconderijo da faca e ao farol verde, entrei à direita na Av. Angélica procurando um carro de polícia.

– Opa, vem um carro de polícia atrás. Merda, não viram meu sinal e nem prestaram atenção na minha buzinada.

Chego no banco e entro na garagem. Pego o celular e faço minha estréia no 190.

– (eu ligando) 1-9-0

– (policial militar) Emergência. Polícia Militar do Estado de São Paulo. Como posso ajudar?

– (eu um pouco ansioso) Senhor, gostaria de fazer uma denúncia.

– (policial militar) O que o senhor deseja denunciar.

– (eu embuído de cidadania e responsabilidade) Senhor, estou em Higienópolis e acabei de ver um morador de rua esconder uma faca grande sob a espuma onde dormia outro homem, ao lado da Praça Buenos Aires.

– (policial militar) E o senhor consegue identificar o local onde ele escondeu a faca?

– (eu satisfeito com minha capacidade de cidadão) Certamente senhor. O homem está deitado junto à grade da praça em frente ao número 760 da Rua Piauí.

– (policial militar) E o senhor viu como ele estava vestido?

– (eu já mais á vontade) Ele estava de short.

– (policial militar cumprindo script) Qual a cor do short?

– (eu já nem tão à vontade) Não lembro a cor do short senhor.

– (policial militar ainda dentro do script) E como era a camisa?

– (eu um pouco frustrado) Não lembro se ele estava de camisa ou sem camisa.

– (policial militar dando esporro) E como o senhor quer que a gente ache o suspeito sem uma descrição de como ele está vestido.

– (eu irritado, mas super educado) Senhor, eu tive a preocupação de anotar o endereço com precisão de onde a faca foi escondida sob a espuma que um morador de rua estava dormindo. É só ir lá e apreender a faca.

– (policial militar caindo na real) E ele estava na Praça Buenos Aires, certo.

– (eu mais aliviado) Sim, em frente ao número 760 da Rua Piauí.

– (policial militar voltando a perder a paciência) Mas é na Praça Buenos Aires ou na Rua Piauí?

– (eu condescendente e sabendo que Sampa é grande e que é impossível conhecer a cidade toda) Senhor, a Rua Piauí passa ao lado da Praça Buenos Aires.

– (policial militar formal) Nós iremos mandar uma unidade para verificar. Obrigado.

Desliguei e constatei que estou em uma fase bem zen. Tive tempo de pensar, avaliar e desistir de falar em determinado momento da conversa: – Da próxima vez vou pedir ao meliante o RG (identidade em carioquês) e fazer eu mesmo a apreensão da arma e deixá-lo preso com minhas teias ultra fortes. Se eu me chamasse Peter Parker teria um fotolog e não um blog. Acredita nisso? :P

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3 Comentários

  • FMatt disse:

    Hahhaha é a triste realidade :P

    Já chamei a polícia 2 vezes. Na primeira foi simples e a viatura chegou muito rápido, na outra que era uma emergência maior, fiquei 5 minutos no telefone com o atendente (muito burro) me enrolando.

    Triste realidade.

    Comentário do Pô, meu!
    Fala Franco!
    Não fiquei para ver se a polícia foi ou não buscar a faca do cara. Acho o trabalho do pessoal do 190 fundamental, mas acho também que os atendentes não podem passar um grama de emoção. E isso é treinamento e seleção.
    Abração,
    Nelson

  • Isa disse:

    Isso foi muito consciente da sua parte!
    Independente do que tenha acontecido, você se mostrou muito preocupado com a segurança alheia!!
    Só espero que não sejam como os bombeiros. Liguei uma vez por causa de um vazamento de gás na minha casa, e eles chegaram duas horas e meia depois. Já tinha dado tempo do meu gato de pelúcia ter ido pelos ares nesse meio tempo.
    Beijos!!

    Comentário do Pô, meu!
    É verdade Isa,
    Esse tipo de serviço público, às vezes, ainda deixa muito à desejar.
    Ô coitado do seu gato!
    Beijos,
    Nelson

  • Eu tenho uma amiga canadense. Um dia comentei com ela que quase atropelei uma mulher, na av. Água Espraiada (me recuso a chamar de Roberto Marinho) que, aparentermente drogada, dançava no meio da rua, próximo à favela que tem ali.
    A minha amiga me perguntou: – Mas você chamou a polícia para retirá-la do local, não?
    Pensei na complicação que foi uma vez, que liguei para o 190 para denunciar um assalto QUE ESTAVA ACONTECENDO NAQUELE MOMENTO. Pensei no tempo que levaria para alguma viatura chegar. Lamentei morar em um país tão diferente do dela…

    Comentário do Pô, meu!
    Enio,
    Sabe que o seu exemplo comparativo mostra a diferença que temos para o Canadá. A Av. Água Espraiada, que adoro o nome, foi batizada com o nome do jornalista aprendiz de manipulador político, pela prefeita do PT – Partido dos Trabalhadores, que junto com o maluco Brizola, foi quem mais criticou quem quase que efetivamente mandou nesse país por muitos anos. Que país é esse?
    Abração,
    Nelson

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