Kombi, tenho uma história


Em uma era onde a tecnologia é substituída com quase a mesma velocidade que vamos ao salão cortar cabelos, homenagear uma tecnologia que é aposentada, aliás tardiamente se pensarmos unicamente com o foco do desenvolvimento tecnológico, representa uma homenagem aos seres humanos. Sim, a nós mesmos (apesar de tudo), que fomos usuários dessa tecnologia que atravessou toda a metade do século passado e só agora, já no meio da segunda década desse século, será definitivamente abandonada.

Estou falando da Kombi. A perua para paulistas, o furgão para os generalistas, ou simplesmente a Kombi para os demais. Quem nunca teve uma história interessante com uma Kombi que merecesse ser guardada, perdeu uma ótima oportunidade que não mais existirá. Eu mesmo tive duas primeiras vezes com a Kombi: uma primeira viagem de Kombi e a primeira vez que dirigi (guiei, paulistas) uma Kombi.

Foi no Carnaval de 1975. Minha prima Mônica, uma carioca que morava e ainda mora em Belém (PA), e seus pais, estavam passando férias na minha casa no Rio. A mãe de uma mina maravilhosa que eu estava xavecando (paquerando a garota, cariocas) nos convidou para acamparmos durante o Carnaval em Visconde de Mauá (RJ). Eles tinham duas barracas, uma era quase um apartamento, e uma Kombi, o que viabilizava o programa. Obviamente que fiz uma pressão no pessoal lá em casa (a prima e os irmãos) para que aceitássemos o convite. Já me imaginava naquele paraíso de Visconde Mauá, seus banhos de cachoeiras, trilhas e matas para andar a cavalo, uma espetacular oportunidade para sacramentar minha paquera. E-lê-lê! Eles toparam.

Mas em cima da hora, talvez na véspera da partida para o camping de Mauá, o pessoal lá de casa roeu a corda e desistiu. Eu fiquei desesperado, naturalmente. Vinha sonhando com essa viagem há dias e agora aquela gatinha, que podia aproveitar o paraíso comigo, ia estar disponível para a gaviãozada do camping, sozinha. Quando tudo parecia perdido e o desespero se avizinhava, a mãe da mina deu a solução: “Vem só você com a gente.”

Deu paúra. A família, além dos pais e da garota maravilhosa, tinha uma irmã mais velha um ano e um irmão mais novo com uns 12 anos, que levaria um amiguinho da mesma idade dele. Como que eu, adolescente ainda, mas já cultivando belas costeletas, me encaixaria nessa trupe sem dar na pinta qual era meu objetivo maior? Acabei topando. Naturalmente vencendo uma pressão contrária de todos lá em casa.

E lá no sábado de Carnaval, pela manhã, embarquei na Kombi super carregada em direção sul, às montanhas da Serra da Mantiqueira, junto ao Parque Nacional de Itatiaia. A mãe da minha paquera era super sem noção descolada, falava alto, ria mais alto ainda, inventava brincadeiras bobas, puxava o saco do filhote caçula e, meu constrangimento e início de arrependimento, principalmente depois que um dos colchonetes voou estrada atrás e foi perdido, só não se concretizou porque eu não parava de olhar aquela bermuda amarela curta (para 1975) que a mina usava.

Chegamos ao camping, montamos a estrutura onde a Kombi tinha um papel importante, já que ficava na frente da barraca apartamento apoiando o toldo da “varanda” e servindo de depósito para víveres de tantas pessoas por todo o Carnaval. Mais do que esse papel simbólico à frente de nossa tribo, a Kombi foi determinante no dia que choveu muito, mas muito mesmo, e a barraca pequena, onde ficávamos eu e os dois meninos, fez água por todos os lados. Lembro de ter terminado aquela noite de sono em um dos bancos da Kombi. Não lembro dos meninos, mas é bem provável que o caçula tenha ido pro quarto dos pais na barraca apartamento.

Aproveitei muito aqueles dias, nada que dormir em colchonete fino sobre o chão duro, ou o banho de água fria do camping, ou as piadinhas (*) da mãe da garota pudessem diminuir as delícias dos banhos de cachoeira na Maromba, de mergulhos no rio Preto, cavalgadas pelas estradas de chão e trilhas, e o mais importante, o tempo todo junto dela. Nem lembro da volta. Só lembro do trabalhão que fui escalado no retorno: limpar as barracas na garagem do prédio antes de guardá-las. Foi a gota d’água para que nunca mais eu me aventurasse em campings.

Aquela Kombi será sempre inesquecível, pois se não fosse por ela nunca teria sido convidado para passar o Carnaval de 1975 em Visconde de Mauá com a melhor garota do mundo. A outra história? É bem menos importante. Fica para outra vez. ;-)

O vídeo abaixo é muito emocionante, é a despedida da Kombi. Não deixe de assistir.

(*) Sogrona, essa era só a visão daquele adolescente. Hoje penso bem diferente, tá? ;-)



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