Schumacher, para sempre Dick Vigarista


1994 foi um ano extremamente marcante para a Fórmula-1. Foi em 1994 que os amantes das corridas de automóveis sofreram horas esperando a notícia que todos sabiam que não receberiam, desde que viram Senna sem movimentos no cockpit da Williams no Grande Prêmio de Ímola, e fiscais encobrindo a cena com um pano (seria plástico?) azul.

Foi também em 1994 que despontaria um novo gênio das pistas de corridas, que nos anos seguintes viria a pulverizar todos os recordes acumulados em décadas de corridas de Fórmula-1. Talvez inspirado na frouxidão punitiva que permitiu Prost bater em Senna para ser campeão em 1989 (video) e no ano seguinte, Senna deixando-se envolver em acidente com Prost para também ser campeão (video), o novato alemão Michael Schumacher ganha seu primeiro título mundial envolvido em uma situação nada abonadora para uma comemoração de campeonato.

Simplificando aquele acontecimento, depois que Senna morreu em Ímola, a disputa daquele acirrado campeonato ficou entre Damon Hill da Williams e Michael Schumacher da Benetton. Na última prova, o Grande Prêmio da Austrália em Adelaide, Schumacher liderava o campeonato. Por conta disso, bastava-lhe chegar na frente de Hill. Como provado inúmeras vezes nos últimos anos, Schumacher cumpria sua lição com perfeição, estava à frente de Hill. Mas numa grande bobeada, ele perdeu o controle de sua Benetton e bateu na parede. Mesmo com a suspensão comprometida, sem mais condições de disputar aquela corrida, ele volta à pista e em um lance patético e de demonstração de falta de ética e honestidade, ele dança na frente de Damon Hill até que o inglês não conseguindo desviar acerta em cheio Schumacher e abandona também a prova. Nenhum dos dois marcam pontos e Schumacher conquista seu primeiro campeonato.

É bom lembrar que naquele ano, a Benetton era muito superior à Williams e à qualquer outra equipe. Houve muita discussão e denúncias de que seus carros estavam fora do regulamento. Nada foi provado. Mas o tal alemãozinho já mostrava sua índole (seria caráter?) tendo sido punido por conduta antiesportiva, ficando de fora de duas corridas. Nascia aí Dick Vigarista de carne e osso.

Bi-campeão em 1995, Dick trocou a Benetton pela Ferrari em 1996. A Ferrari vinha de um jejum gisgantesco de campeonatos e esse ano celebrou o casamento da capacidade dos italianos com automóveis de corrida com um piloto fora de série. Prepararam um carro que despontava em 1997 como um dos favoritos. Mas em 1997 a Williams trouxe para a Fórmula-1 o campeão de 1996 da Fórmula Indy, em mais uma tentativa de mostrar que o campeão da categoria americana poderia fazer sucesso também na Fórmula-1. Eles sempre fracassaram. O contrário, o campeão da Fórmula-1 na Indy, já estava provado que poderia fazer sucesso, vide Emerson Fittipaldi, Nelson Piquet e Nigel Mansell.

Jacques Villeneuve foi o campeão da Indy 96. Jacques era filho de um dos pilotos de Fórmula-1 mais loucos que eu conheci, o canadense Gilles Villeneuve. Villeneuve pai cansou de nos mostrar na prática, a tese teórica que só se conhece os limites, se estes forem ultrapassados. Gilles nunca ia aumentando a velocidade que fazia as curvas para testar seu limite, ele ia sempre acima deles, rodava, batia e ia diminuindo até saber de verdade qual era seu limite. Morreu em um acidente nos treinos para o Grande Prêmio da Bégica, no circuito de Zolder em 1982, em que foi envolvido em uma fatalidade. Naquele momento, ele não estava testando nenhum limite.

Voltando ao campeonato de Fórmula-1 de 1997, Jacques, o filho de Villeneuve, que havia conquistado o título da Indy em 1996 chegou na última prova, o Grande Prêmio da Europa em Jerez de la Frontera, Espanha, com menos um ponto que Dick Schumacher Vigarista. Foi uma corrida fantástica desde os treinos, onde três pilotos fizeram o mesmíssimo tempo (Schumacher, Villeneuve e Frentzen). Schumacher por ter feito seu melhor tempo antes dos outros, largou na pole. Lá pelo meio da corrida, em um ponto que nem Schumacher poderia acreditar, Jacques, com o espírito combativo de Gilles, coloca seu Williams por dentro em uma curva de baixa para ultrapassar a Ferrari de Schumacher. Dick, que já devia ter isso em mente, computou que como ele estava na frente no campeonato com mais um ponto, seria campeão se os dois pilotos não terminassem a corrida.


Nesse momento, de maneira acintosa e vergonhosa, o bicampeão Dick Schumacher Vigarista joga literalmente seu Ferrari em direção da Williams de Villeneuve, ambos saem da pista, mas, inacreditavelmente, Villeneuve consegue voltar enquanto o alemão patinava na brita para abandonar pateticamente aquela corrida. Jacques Villeneuve chegou em terceiro nesta corrida e foi o campeão do mundo de 1997, enquanto Dick era penalizado perdendo todos os pontos que conquistou naquele ano. Infelizmente não lhe tiraram as 5 vitórias que obteve por conta de seu imenso talento dentro do cockpit.

Nove anos depois e com Schumacher com mais cinco títulos mundiais na sua bagagem, preparando-se para encerrar a carreira com o oitavo título mundial, consagrado, indiscutivelmente o maior vencedor da história da Fórmula-1, o que vemos nos treinos para o Grande Prêmio de Mônaco 2006 no circuito de rua de Monte Carlo? Dick de volta! Esperei quatro dias na expectativa de uma justificativa razoável, mas hoje, estou convencido que o piloto que mais venceu na Fórmula-1, tem realmente o direito de levar com ele o estigma de Dick Vigarista. Não precisava. Saudades de Senna.

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1 Comentário

  • Fábio Kawagoe disse:

    A lembrança é boa, mas algumas correções.
    – Jacques Villeneuve foi campeão da Fórmula Indy em 1995. O canadense fez a estréia na Fórmula 1 em 1996 pela Williams em Melbourne, na Austrália;
    – Aquele tríplice empate no treino classificatório com o mesmo tempo: Jacques Villeneuve, Michael Schumacher e Heinz-Harald Frentzen. O canadense é quem ficou com a pole, já que conseguiu o tempo antes do piloto alemão da Ferrari e
    – Realmente, Michael Schumacher perdeu o 2. lugar no Campeonato, mas não os 78 pontos conquistados na temporada de 1997 como decidiu a Federação Internacional de Automobilismo.

    Comentário do Pô, meu!
    Oi Fábio!
    É um prazer imenso receber aqui no Pô, meu! alguém que também goste de corridas de Fórmula-1. Sua intervenção serve, além de corrigir meus enganos, para que as pessoas ao me lerem, saibam que isso não é uma enciclopédia. São minhas memórias e recordações, que falham prá caramba. :-D
    Obrigado.
    Grande abraço,
    Nelson

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