Pai é pai
- Por Nelson Correa
- 29 dezembro, 2009
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Fiquei bastante irritado com toda essa celeuma que se criou em torno do menino Sean Goldman que foi sequestrado pela mãe há cinco anos, tirando-o dos Estados Unidos com intenções não reveladas, trazendo-o para o Brasil, e aqui permanecendo de forma ilegal, conforme tratados internacionais assinados pelo Brasil. Aqui no Brasil, ela se casou com um advogado de família tradicional e de forte reconhecimento no meio jurídico do Rio de Janeiro. Não sei se por conta disso ou, independente disso e por conta da pouca eficácia da justiça brasileira (quiçá uma mistura de ambos), um caso que lá nos Estados Unidos costuma durar 2 meses, por aqui se arrastou por mais de 4 anos até que o presidente do Supremo Tribunal Federal desse o veredicto final.
A ideia não é contar aqui essa história que já foi contada e continua sendo contada com rasgos de desgraça, cenas apavorantes, camisetas de guerra e etc. Eu sou pai. Sou pai mesmo. Não sou (só) pai biológico! Não doei espermatozóides para o nascimento dos meus filhos, muito menos fui convencido pela mãe deles para nos relacionarmos até que ela engravidasse, quando então meus préstimos seriam encerrados. Fui um pai completo.
Desde a primeira vez que seus corações foram ouvidos por gente aqui desse mundo, eu estive presente. Na primeira ultrassonografia, eu já estava tentando identificar onde era a cabeça e onde era a bun… err… o bumbum. Antigamente (Daniel tem 25 anos) as ultrassonografias não eram essa beleza de resolução gráfica como são hoje. Acompanhei cada visita ao obstetra da minha mulher, junto com ela. Lutamos juntos para que Daniel nascesse, pois quase que ele foi embora muito antes do tempo. Lutamos juntos, já com alguma experiência, para que Juliana tivesse o mesmo destino de sucesso, pois sua gestação também foi complicada.
Acompanhei minuto a minuto o trabalho de parto. Não assisti o nascimento do Daniel porque o diretor da Maternidade fazia uma cesárea no mesmo momento e me proibiu de entrar no centro cirúrgico. Mas acompanhei o parto da Juliana, pois o obstetra era amigo do diretor da maternidade em que ela nasceu. Dei banho, troquei fralda mijada e cagada, limpei vômito, fiz sopinha, dei mamadeira, brinquei com eles, vivi os primeiros anos de cada um com muita intensidade.
Ambas as avós foram bastante presentes. E avó, sabe como é, é mãe pela segunda vez. Ambas ajudaram muito. Mas nenhuma das duas consegue ser pais deles como fui, nem em 10%. Nenhuma das duas poderia me fazer ficar longe dos meus filhos, qualquer que fosse o motivo. Eu viraria uma fera ensandecida. E foi pensando em como eu reagiria se estivesse na posição de David Goldman, que torci muito pelo final que essa história teve. Ele é o único pai de Sean.
Isso tudo me fez relembrar um momento dos mais marcantes da minha vida. Daniel tem quase 5 anos a mais que Juliana. Daniel foi muito esperado, foi uma batalha ele ter chegado, depois foram outras batalhas para ele ter ficado. Eu sentia um amor imenso por Daniel. Perto do nascimento de Juliana, fiquei muito tenso. Ela era tão esperada quanto ele, nós também brigamos para ela chegar, por que então eu me preocupava tanto? Eu, na minha solene ignorância, achava que teria que reduzir à metade meu amor por Daniel para que houvesse espaço semelhante para Juliana. E se eu não conseguisse? Afinal, já tínhamos uma convivência de quase cinco anos?
Quando Juliana nasceu, essa preocupação ficou minimizada nas minhas prioridades, pois a emoção da chegada da vida sempre é muito mais forte. Um dia, talvez andando com Juliana dormindo no meu ombro, passeando pelo jardim, junto ao jasmineiro que insistia em florir em excesso e derramar seu perfume em toda a volta, descobri que o espaço onde guardava o amor por Daniel se expandiu sem eu nem perceber, e nada que era dele precisou ser diminuído. O amor que eu sentia por Juliana, duplicou minha capacidade de amar meus filhos. Eu sorri, como só sábios pais podem sorrir.
Sucesso David Goldman. Que você possa ser um pai completo e não só biológico, para o já nem tão pequeno, e bastante explorado, Sean. Ele merece um pai de verdade.
:’)
:-*