Bagdá Café


Sábado, 21 de agosto de 2010 em uma cidade maravilhosa às margens do oceano Atlântico, no continente sulamericano. Fatos:
– Um dos grandes traficantes de drogas de favela, que comanda uma das maiores comunidade da zona sul da cidade, decidiu ir a uma festa na favela vizinha, uma pequena comunidade que já recebeu até visita de um papa, que é sua também.
– Como não é bobo, leva consigo um exército de 60 criminosos fortemente armados com pistolas, granadas, fuzis e metralhadoras.
– Policiais da Inteligência do Batalhão da Polícia Militar, em um bairro noblíssimo da zona sul da cidade, vizinho dessas favelas, tomam conhecimento durante a madrugada que o tal chefe do tráfico da grande favela estava em uma festa na pequena favela vizinha, que é dele também.
– Estes policiais decidem sair para uma emboscada na entrada da favela e tentar prender o chefe do tráfico.
– Por cautela ou seja lá o que se passou na cabeça dos 12 policiais militares, eles resolvem não acordar os comandantes da Segurança Pública do estado, e vão atrás do criminoso sem o aval dos seus comandantes.
[Não me pergunte se é preciso o aval do comando para sair atrás de bandidos e tentar prendê-los, estou só relatando fatos.]
– Na saída da favela houve o encontro entre os criminosos e os policiais que estavam à paisana.
– Aqui há um hiato nos relatos da imprensa, pois entre a saída da pequena favela e um hotel 5 estrelas à beira da praia onde o campo de batalha foi formado, há uma belíssima (extraordinária) estrada na montanha, pendurada sobre o mar, com aproximadamente 3km de um ponto ao outro do teatro de batalha.
– No entorno do hotel 5 estrelas, que é caminho obrigatório para a grande favela, os criminosos encontraram outros policiais militares, muito provavelmente avisados pelos 12 que estavam na espreita, à paisana, na saída da pequena favela.
– O estacionamento do hotel, a avenida à beira da praia, a própria praia, as ruas em volta do hotel e o próprio hotel viraram um campo de batalha, com muitos tiros de armamento pesado (de guerra), granadas, escaramuças e perseguições.
– Trinta e cinco hóspedes do hotel 5 estrelas foram feitos reféns e depois libertados pelo Batalhão de Elite da polícia.
– Aproximadamente 50 bandidos fugiram para a grande favela próxima do hotel (cerca de 1km)
– Uma mulher que a polícia identificou como criminosa procurada pela justiça, morreu na rua (no campo de batalha).
– Quatro policiais militares foram feridos sem gravidade.
– Dez criminosos que estavam no hotel se entregaram à polícia.
– Dezenas de hóspedes e outros tantos funcionários do hotel, em pânico, abandoram o hotel.
– A polícia suspeita que o chefe do tráfico da região, e alvo da operação sem o aval do comando da Segurança Pública, tenha ficado ferido.
– Carros foram perfurados por projéteis de grosso calibre (de guerra) e vidros de lojas e do hotel, também.
– Pelo menos um cidadão que estava no teatro de batalha foi ferido por tiro, mas sem gravidade.
– Por sorte ou seja lá como isso pode ser chamado, quase não houve baixas.
– Provavelmente a Inteligência falhou pois não sabia quantos eram os bandidos que teriam que enfrentar. Se soubesse que eram 60 não mandariam somente 12 policiais, por mais treinados que fossem, como estavam à paisana, não deviam estar portando armas pesadas, de guerra.

Domingo, dia seguinte:
– Secretaria de Segurança Pública, para aumentar a sensação de segurança da população no local que fora campo de batalha na véspera, estaciona vários veículos da polícia sobre calçadas do bairro, na entrada das favelas e em pontos estratégicos.
– Não há notícias se as forças de segurança pública do estado estão buscando o chefe, provavelmente ferido e os outros 50 criminosos que se escafederam e seu poderoso armamento de guerra.
– O governador garantiu que bevemente as duas favelas desta história, a grande e a pequena, estarão livres do poder paralelo. Não disse quando.
– O secretário de segurança pública destacou a ação firme, profissional e com efetividade da polícia.
– O ministro das cidades atribuiu o episódio a uma ação isolada de um grupo de bandidos da região. Seja lá o que isso queira significar.
– Não há comentários sobre os 12 policiais responsáveis por tudo isso que vimos ontem, muito menos seu paradeiro ou futuro.
– Grande portal da internet mostra que a rotina voltou ao local do teatro de batalha. Pessoas estão curtindo a praia e o domingo de sol, menos de 24 horas após a guerra no local.
– População do resto da cidade não demonstra indignação e muito menos cobra das autoridades o fim desse estado de sítio.

Notícias Gerais:
– Pesquisas mostram que atual governador deve ser reeleito no primeiro turno. Também mostram que o candidato da situação ao governo federal que é apoiado pelo governador, também deve ganhar no primeiro turno, demonstrando apoio explícito da maioria da população.
– Dezenas de policiais militares fazem blitzes com bafômetro que caçam todas as noites, de segunda a segunda, motoristas com álcool no sangue (a minoria <5%) e inadimplentes com IPVA (a maioria >95%). Um sucesso! Centenas de apreensões foram feitas nos últimos 12 meses.
– Escolas de samba começam a contar os meses para o grande desfile do carnaval 2011.
– Não. Não é verdade que Bagdá Café seja um filme dramático de guerra. Na verdade, é uma comédia, um dos principais cult-movies dos anos 80.



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4 Comentários

  • Chantinon disse:

    Assista Alpha Dog, um filme sobre ricos envolvidos com tráfico.
    Um dia já fui liberal e defensor dos direitos humanos. Cancei. Ainda acredito que a grande maioria das pessoas são boas, mas a cada dia vejo que a alienação e irracionalidade tomam conta de todos. Corrupção não é somente dar dinheiro ao guarda, aceitar é uma forma de apoiar, e é pelo voto que vemos quem é nosso povo.

    • Nelson Correa disse:

      Caro Chantinon,

      É essa constatação que me deixa mais triste com o futuro próximo: na média, o brasileiro ainda apoia tudo-isso-que-está-aí com convicção. Ou como diria o Barão de Itararé, ou qualquer outro: “Ou se restaure a moralidade ou nos locupletemos todos”

      Abraços e esperança,
      Nelson

  • valdir nascimento disse:

    É, seu Nelson,embora eu tenha um certo costume em querer contrariar opiniões, neste caso em expecifico, como tirar sua rasão? não tem como,não é mesmo? e parabêns pela comparação feita,muito boa mesmo, analogicamente falando.

    • Nelson Correa disse:

      Oi Valdir,

      Eu só fiz relatar os fatos que foram publicados pela imprensa. Nesse artigo não tem quase nenhuma opinião. Ok, tem um pouco de sarcasmo no final, mas é impossível eu deixar de colocar uma pitadinha ao menos, de sal. ;-)

      Abraços,
      Nelson

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