Música erudita é para o povo?
- Por Nelson Correa
- 16 novembro, 2009
- 17 Comentários
Nós vivemos a época do efêmero, da superexposição, do grotesco, da banalização, do nanosegundo, do popularesco, do ultraperecível. E no meio da troca dos famosos de ontem pelos novíssimos famosos de hoje, entre minissaias rosas e fazendas surreais número 2, “ouvi” (na verdade li) uma reclamação que o governador do Distrito Federal, para a festa dos 50 anos de Brasília em 2010, só está gastando com shows de música pop. Nenhuma ação com música erudita. A reclamação em si já chamou minha atenção. Mas não parou aí. Logo em seguida, eu ainda na “escuta”, ouço a filha da indignada senhora retrucar: “Mãe, ao invés de reclamar, ajude a divulgar a semana da viola da gamba que começa hj na escola de música.”
A música erudita, muitas vezes também chamada de clássica, chegou lá em casa muito antes dos meus primeiros LPs (Long Plays) de música pop e rock and roll. A coleção de discos dos compositores clássicos (Bach, Mozart, Beethoven, Chopin, Strauss, Vivaldi, etc) e a coleção completa de livros do Monteiro Lobato, estavam disponíveis para a nossa iniciação cultural. Assim como tive alguns livros favoritos na coleção do Monteiro Lobato, também tive alguns compositores que me agradavam colocar o disco na vitrola e ouvir outras vezes. Mas tanto Lobato quanto os clássicos da música erudita, ficaram guardados no passado.
Viola da Gambá? Conheço um pouquinho de nada de instrumentos, posso até não juntar nome à pessoa, mas já devo ter lido o nome de quase todos os instrumentos usados em orquestras. Aprendi a tocar violão. Lá em casa teve um piano que minha irmã tocava. Mas que instumento seria esse, relacionado com um bicho tão estranho como o Gambá. Esqueça o acento no último “a”, é só gamba, viola da gamba. Que na realidade tem origem italiana e significa viola de perna. Para facilitar o entendimento, o violino também é conhecido como viola da braccio, ou viola do braço. A viola da gamba se toca em pé ou apoiada no meio das pernas. Não sei se cometerei uma heresia, mas ela me pareceu parente menor do violoncelo.
Assim que a dúvida sobre o nome e origem do instrumento foram sanadas, eu comecei a pensar no questionamento de se deixar abandonada a música erudita, que tem como um dos grandes expoentes brasileiros, o maestro Heitor Villa-Lobos. Será que gostar da música erudita é um privilégio dos iniciados? Dos eruditos? Será que o povo em geral não tem capacidade musical para entender ou pelo menos gostar, de música erudita? Grande bobagem. Imediatamente me lembrei dos mega concertos do projeto Aquarius, patrocinados pelo jornal O Globo no Rio de Janeiro, nas décadas de 70 e 80. A Orquestra Sinfônica Brasileira chegou a ser assistida por públicos entre 100 mil e 200 mil pessoas em shows abertos e gratuitos na Quinta da Boa Vista no Rio de Janeiro.
O povo gosta da música erudita porque ela tem qualidade. Mas a música erudita não está ao seu alcance. Os políticos, que deveriam ter o apoio de secretários e ministros de cultura, com a capacidade de entender que a arte, qualquer arte clássica, nunca é rejeitada pelo povo, muito pelo contrário, não levam a arte de qualidade ao povo, não universalizam o acesso à essa arte, não massificam o desenvolvimento do bom gosto cultural e artístico pelo povo. É difícil? Hoje é. Pois vivemos a era do simples, do banal. Qualquer um pode comandar um país como o Brasil, gigante, poderoso e um dos atores principais do teatro mundial. Nem precisa ter estudado. Educação, cultura, coloca o capitão Nascimento no comercial do Enem e chama a Madonna para a festa do reveillon.
A mãe indignada é a jornalista Clara Favilla, e sua filha, a musicista internacional, Isabel Favilla. O evento é a IV Semana da Viola da Gamba da Escola de Música de Brasília. Acontece no Teatro da Escola de Música de Brasília – L2 Sul – Quadra 602, projeção D. Começou hoje, mas tem ainda amanhã e quarta-feira. Ah, sim… é GRÁTIS!
Abaixo, uma amostra do instrumento e da arte. Para visualizar direto no Youtube.
Fico feliz que o twitter possibilite troca de informações e gere frutos como esse artigo.
obrigada pelo seu tempo e espaço no blog.
abraços,
Isabel
flautista e fagotista barroca, natural da árida brasília, atualmente vizinha dos diques holandeses.
Oi Isabel,
Foi boa a lembrança da música erudita. No dia-a-dia a gente acaba esquecendo dela. Outro dia, no Twitter mesmo, o prefeito do Rio disse que tinha convidado a Madona para cantar no reveilon do Rio. Lá mesmo, eu perguntei quanto is custar. Mas ele infelizmente não me respondeu.
Foi bom ter me lembrado do Projeto Aquarius e da quantidade de gente que ia à Quinta da Boa Vista, onde era a residência oficial do Imperador, para assistir música erudita. Mas a gente acaba tendo que engolir goela abaixo um monte de porcaria. Quem pode, não ouve, quem não tem discernimento, engole e adora, pois só conhece esse sabor.
Agora, diga a verdade, deve ser muito mais inspirador os diques e flores holandeses que a árida Brasília.
:-D
Abraços e sucesso,
Nelson
OI Nelson,concordo com vc em tudo no artigo.Gosto de musica popular e erudita,e creio que é questao de educar os ouvidos e de ter acessso.Meus filhos crescerao indo a concertos de “pedro e o lobo” e o “quebra nozes “todo ano ,religiosamente, onde nos morassemos.Eles tem boas recordaçoes disso.Tem varias salas aqui em sp e suponho ai no Rio tb,que tenham concertos gratis ou populares.O que creio é que tem pouca divulgaçao!bjs
Olá Nine,
Até hoje, todos os concertos que toquei no Brasil tiveram entrada franca, exceto um, que foi feito de maneira independente e tivemos que cobrar 20 reais a inteira para bancar o aluguel da sala e transporte de instrumentos.
Em julho toquei no Centro Cultural São Paulo, que fica na saída do metrô Paraíso. Excelente infraestrutura e produção, tudo grátis.
No Rio já participei algumas vezes da série música no museu que tem programação intensa toda gratuita em espaços bonitos da cidade. vale conferir a programação dos dois lugares!
bjs
ps: nelson, não fala mal da minha árida brasília, que eu fico triste. não odeio completamente! rs… e essas tulipas holandesas perdem pra chuva, pro vento e pro medo do dique não dar conta!
Oi Isabel,
Eu nem falei mal de Brasília, só falei bem da Holanda.
:-D
Ainda bem que você avisou antes…
;-)
Abs,
Nelson
OI Isabel, obrigado,e reforça o que eu disse, moro perto do metro brigadeiro e nao fiquei sabendo do seu concerto e teria ido ,salvo doença!abs
oi nine, se você tiver twitter, siga o ccsp por lá e outros similares. é ótimo!
bjs
Taí uma ótima ideia!
Procurar publicar aqui no Pô, meu! esse tipo de eventos. Vou me esforçar.
Abraços,
Nelson
Olá Nelson,
Infelizmente o mundo globalizado vem nivelando tudo, e por baixo.
Até os anos 90 o maior numero de discos vendidos na Europa eram de música erudita. Isso mudou. Hoje pessoas até 30 anos de idade ainda são adolescentes, escutando o que estiver na onda (moda).
Costumo dizer que nada no mundo baixa de preço, só cai de qualidade. Para contradizer-me veja só o que acontece com a musicalidade de hoje. Poucas são as vozes reais e que não dependem de um computador.
Certa vez ouvi um ensaio de uma menina soprano em João Pessoa – PB. Fiquei maravilhado, e voltei 2 semanas depois pensando em ouvi-la novamente. Tive a notícia que a escola de música havia fechado as portas.
E o mundo que se diz livre e onde se vende a imagem de distribuição de renda e tudo pelo social, no fundo, está cada dia mais seleto, onde só ricos podem desfrutar de coisas com qualidade, do queijo a arte, o povão só fica com os restos.
abraços
Meu amigo Chantinon, bom demais ter você por aqui novamente.
Isso que você disse é uma verdade.
O que me preocupa é que isso é como a história do ovo e da galinha, quem nasceu primeiro?
Se o povo não recebe cultura e educação, não faz escolhas políticas sensatas. Se baseia na capacidade de oratória e na capacidade de políticos canalhas lhes iludirem. Nessas horas, o poder público precisa fomentar e levar a cultura, que está intimamente associada à educação, à sociedade em geral.
Mas normalmente a baixa capacidade educacional, muitas vezes é o diferencial usado pelos maus políticos para se apresentarem iguais ao povo, por isso merecerem o voto do povo (eles usam isso mesmo!).
Nosso dever, como pessoas com um pouco mais de experiência, é fomentar sempre esse acesso à cultura e artes em geral.
Abraço grande e sucesso,
Nelson
Música erudita sempre faz sucesso! Basta lembrar como os parques ficam (ou ficavam) cheios nos Projeto Aquarius na Quinta da Boa Vista, ou no ex-tradicional Quebra-nozes do Theatro Municipal do Rio!
A impressão que eu tenho é que tem uma “demanda reprimida” por eventos assim. A Música dos Grandes Mestres, principalmente a composta no século XIX, encanta ouvidos de todas as idades e condições sociais.
Aproveitando a Viola da Gamba, recomendo procurar a Sonata BWV 1029, do Grande João Sebastião Ribeiro. É para este instrumento e cravo. Um de meus prediletos! Tem no YouTube…
[]s!
Grande Marlão!
Isso mesmo: demanda reprimida.
Mas você há de concordar que a iniciativa privada não tem como bancar isso. Para atender essa demanda reprimida ao preço que o povo pagaria (R$ 0,00) tem que ser iniciativa do governo ou como verba de marketing.
Como você não deu o link, achei esse abaixo. Serve? Tem algum melhor na sua opinião? Me diga que quero colocar.
;-)
engraçado vocês falarem de demanda reprimida. muitas vezes sinto isso no meu próprio meio ao propor programas, ou peças que segundo os produtores “o público não quer ouvir”. não quer ouvir pq não querem me deixar tocar! rs…
nelson, esse seu link, além de tar sendo tocado com violoncelo e não na gamba, o cravo tem um som horrível!! desculpa… é que a cópia de instrumentos antigos vem se aperfeiçoando cada vez mais e nessa época desse vídeo ainda não era aquelas coisas. tenta esse link, é o primeiro movimento da mesma sonata:
bjs
Oi Isabel!
Obrigado pela consultoria musical. Olha só, o Pô, meu! tá chique.
Aí está a sua sugestão, e realmente é espetacular.
Bjs,
Nelson
Oi Nelson e Isabel.
Agora que eu consegui acesso ao YouTube de novo pude ver confirmar o video da sonata BWV1029. Essa que a Isabel mostrou é linda, embora só tenha o primeiro movimento…
Bom, sobre a demanda reprimida, minha impressão é que as pessoas de uma forma geral gostam e vão a eventos de música erudita, mas não pagariam por isso…
Vejamos: o Brasil não é a Áustria nem Alemanha, onde há tradição e uma indústria de turismo que torna viável cobrar 150 euros por uma apresentação da Filarmônica de Viena. Pessoas do mundo todo vão lá pra isso.
Um desejo que ainda realizarei é justamente assistir os festivais Wagner e Mozart que ocorrem por essa época agora em Bayreuth e Salzburg…
Já no .br tem que haver subsídios mesmo. Não tem jeito.
Ainda sobre preços, o mesmo assunto, mas um público-alvo diferente (pros que tem cartao de credito internacional): A Deutsche Grammophon vende albuns pela internet e esta fazendo o maior sucesso! Albuns consagrados da DG saem por até 12 dolares! Outro dia comprei um album raro que eu tinha em LP, e agora foi relançado em MP3: Also sprach Zarathustra, com Berlin/Karajan dos anos 70. Imprerdível!
http://www.deutschegrammophon.com
Oi, passei pra conhecer seu blog, e desejar boa noite.
muito legal o conteúdo!
aguardo sua visita :)
Olá puravida!
Olha, é estranho me comunicar com alguém com esse nome. A gente poderia conversar com o seu nome e fazer uma propagandinha do seu blog. Vou passar por lá para te visitar.
;-)
Abraços e sucesso,
Nelson