Iniciação poética
- Por Nelson Correa
- 16 outubro, 2009
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“No quarto ano, uma doce professora me seduziu e mostrou como canalizar e transformar aquele ódio, em paixão pelas palavras. Devo minha iniciação a ela. Mas isso é assunto para outro post.”
Com essas palavras finalizei o artigo publicado em 7 de fevereiro de 2008, cujo título era: “Primeiro, foi ódio”. Quer ir lá para ler antes de continuar aqui? Pode ir, eu espero. Clique aqui e depois volte.
Leu? Pois é, você viu que minha relação inicial com a Língua Portuguesa não foi das melhores. Mas viu também que um professor me mostrou que essa relação poderia ser muito mais interessante, para mim. Pois é, esse tema voltou à minha cabeça essa semana por conta do Dia do Professor (15 de outubro). Também por conta da montanha de dinheiro que o Rio de Janeiro, junto com o governo federal, vão gastar para fazermos os Jogos Olímpicos de 2016. Ah, também porque li que o Brasil iria emprestar 10 bilhões de dólares para o FMI.
E o professor, coitado, o máximo que consegue de apoio oficial, de valorização, é um filmete de propaganda do Ministério da Educação e Cultura que quase acerta a nossa necessidade, mas é cego para entender que valorizar o professor é ter um plano para que esse profissional, fundamental no desenvolvimento de qualquer nação, venha a ser remunerado proporcionalmente à sua importância, e não gastar dinheiro produzindo e divulgando filminhos de marketing vazios.
Na quarta série do ginásio, eu e Paulinhão (era o Paulinho do admissão) resolvemos prestar concurso para a Escola Técnica Federal do Rio de Janeiro. Nossos pais contrataram professores para nos prepararem: matemática, ciências e português. Dentre as tarefas semanais obrigatórias da aula de português, muito mais focada em literatura e sem o halterofilismo gramatical da professora que nos preparou para o concurso do Colégio Pedro II, estava a elaboração de uma redação.
Minha professora, uma jovem senhora de pele muito branca e bochechas rosadas foi a primeira leitora estusiasmada com a minha tentativa de contar histórias. E ela me incentivou muito. Elogiava. Corrigia. Sentia que às vezes, ela até vibrava (estarei sonhando?). No final do ano, depois que fomos aprovados nas provas para o ingresso no CEFET, Maria Margarida, esse era seu nome, me iniciou na paixão pela poesia, me presenteando com o livro Impurezas do Branco, de Carlos Drummond de Andrade, que ficou para sempre, meu poeta favorito. O primeiro livro de poesia a gente nunca esquece. Obrigado Professora.
Amor é privilégio de maduros
estendidos na mais estreita cama,
que se torna a mais larga e mais relvosa,
roçando, em cada poro, o céu do corpo.
É isto, amor: o ganho não previsto,
o prêmio subterrâneo e coruscante,
leitura de relâmpago cifrado,
que, decifrado, nada mais existe
valendo a pena e o preço do terrestre,
salvo o minuto de ouro no relógio
minúsculo, vibrando no crepúsculo.
Amor é o que se aprende no limite,
depois de se arquivar toda a ciência
herdada, ouvida. Amor começa tarde.
(Carlos Drummond de Andrade)
O queridinho da professora!
Até hoje.
Só mudei de professora.
;-)