Batendo tambor para maluco dançar

Quando entrei no mercado formal de trabalho, aprendi muito com situações que nunca havia me deparado antes. Meu primeiro emprego foi como mecânico de aeronaves na VOTEC Serviços Aéreos Regionais. Foram mais de seis anos de aprendizado de vida. Lá fui colocado em posição gerencial muito jovem, e tive em minha equipe, profissionais que tinham de experiência, mais tempo do que eu tinha de vida. Mas pude aprender com a ajuda de muitos deles, principalmente do velho amigo Ildefonso, um sub-oficial reformado da aeronáutica que era o Chefe da Seção de Hélices.

Mas as melhores situações vividas foram as cenas hilárias da peãozada (eu fui um deles). Trotes nos recém contratados era uma das situações que mais divertiam o pessoal na pista do aeroporto de Jacarepaguá no Rio de Janeiro. Além dos aprendizes e mecânicos, havia os inspetores. Estes profissionais, normalmente idosos, ficavam circulando nos hangares, entre aeronaves, com pranchetas nas mãos, inspecionando o serviço dos mecânicos e anotando o que era feito. Tudo com muita seriedade.

Primeiro por conta da idade e experiência, depois por conta da função, os inspetores não ficavam brincando com o pessoal. Certa vez, chegou para trabalhar conosco um mecânico gaúcho. Cara sério e excelente profissional. Logo nos primeiros dias, o gaúcho estava trabalhando em um motor de um Sêneca da Embraer, e um dos velhos inspetores toda vez que passava por ele, reclamava de alguma coisa.

A reclamação não era contida, era para que todos ouvissem. O gaúcho foi ficando sério. A fisionomia cerrando e o papo acabando. Lá pela enésima vez que o inspetor foi reclamar do trabalho dele, nosso especialista em motores aeronáuticos, largou o que fazia, jogou as ferramentas para o lado e foi embora pedir demissão praguejando em alto e bom som:

– Não vou ficar aqui batendo tambor para maluco dançar!

O hangar inteiro caiu na gargalhada e não foi fácil convencer o gaúcho que aquilo era uma brincadeira, um trote no novo funcionário.


Mais de vinte anos depois, a cena da deputada dançando no Plenário da
Câmara após a absolvição de um deputado, acusado pela Comissão de Ética de ter recebido dinheiro do Valerioduto, me fez lembrar do gaúcho.

Só que sem humor e com outra visão. Devemos sim, bater tambor em outubro, para ver se os malucos “dançam”.

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4 Comentários

  • Valéria disse:

    Oi, Nelson! Como você falou do blog, fiquei curiosa para ler. E que lembrança boa me trouxe quando você citou o Ildefonso. Tenho até hoje um dicionário português-inglês que ele me deu. Bons tempos de Jacarepaguá!

  • Nelson disse:

    Valéria,
    O Ildefonso é uma das pessoas que conheci mais próximas da pureza de alma. Lamento ter perdido o contato com ele. Se a gente tivesse uma régua para classificar o “bom” e o “mau”, ele certamente estaria na primeira extremidade.
    Obrigado pela visita e comentário.
    Abraços e sucesso.

  • Osmar disse:

    Varandão da Saudade!

    O melhor destes idos momentos são as lembranças dos bons companheiros.

    Comentário do Pô, meu!

    Grande Osmar!

    Que saudades garoto!

    Você foi ator desse teatro e é uma delícia tê-lo aqui no Pô, meu!

    Vamos conversar?

    Abração procê e beijo na Cristina, ;-)
    Nelson

  • Antonio Mendonça disse:

    A quem interessar possa o tel. do Ildefonso(Doutor em hélices) é (021)31378509 . Ele mora em Bráz de Pina e continua com aquele inconfundível vozeirão .

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