Censo 2010, colei e passei


Imagem: Recenseadora do IBGEDesde que soube que o IBGE iria disponibilizar também o questionário do Censo 2010 pela web que estava louco de curiosidade para manuseá-lo sozinho, longe de qualquer recenseador. Aliás, por que as pessoas que aplicam os questionários do censo são chamadas de recenseadores e não somente censeadores? Afinal, os questionários abastecerão o recenso ou o censo 2010? Enfim, isso pouco importa.

Aliás, pouca coisa importa para o governo. É bem verdade que recebi o questionário básico, eu e 95% da população, pois somente 5% responderão ao questionário completo. Mas antes disso, eu precisei me livrar da insistência do (re)censeador que se plantou aqui no prédio. Avisei que estava muito ocupado, com projeto estourando o prazo e não poderia recebê-lo. E mais, avisei que queria responder o questionário pela web, afinal, que bosta de blogueiro seria eu se não aproveitasse essa oportunidade? :-)

Por duas vezes ele tentou me dobrar. Por duas vezes eu pedi desculpas e disse que não poderia recebê-lo. Ele então capitulou, passou no seu posto central do IBGE e trouxe a cartinha lacrada com uma senha para que eu acessasse o site do IBGE e respondesse ao questionário. Fez várias recomendações, principalmente a que a senha que eu estava recebendo tinha validade de 10 dias. Que eu não deixasse o prazo passar, pois ele teria que voltar aqui e aplicar o questionário pessoalmente.

Imediatamente entrei no site do IBGE e saí copiando telas e respondendo ao questionário. Na verdade, o governo quer saber pouco da gente. Quer saber como anda nossa higiene pessoal, intestinos e rins (pergunta quantos banheiros tem na casa), quer saber como é o esgoto, o suprimento de água potável e energia elétrica. E eu jurava que essa seria uma informação que eles deveriam obrigatoriamente saber, afinal, são serviços fornecidos pelo próprio governo! Pode ser para avaliar se a gente percebe que tem isso e nem agradece. Nesse pacote de higiene + energia, nem falaram de gás. Vai ver é para não empolgar muito o Eike Batista que descobriu uma Bolívia de gases no Maranhão (eca!).

O governo também quer saber se sabemos ler e escrever, mas não faz questão de conhecer nossa escolaridade. Quer saber quanto a gente ganha, e é incisivo nesta questão, pois nos obriga a preencher dois campos de respostas, por pessoa da casa: um com a faixa salarial dentre algumas que ele propõe e outra com o valor exato. Não entendi, seria alguma pegadinha? Ou serve para que alguns brasileiros especiais (por exemplo, outro exemplo) possam responder o valor declarado ao fisco em um campo e o valor repatriado, escondido em casa, guardado nos paraísos fiscais, no outro campo. Se um dia for argüido(pelo Papai Noel), um dos dois estará certo.

O governo já aceita casais do mesmo sexo no questionário. Belo avanço. Se a Marina Silva fosse a presidente, ela pediria um plebiscito para saber se poderia colocar isso no censo. O questionário tira até uma onda com a mulherada, pois coloca que pode existir mais de um responsável pela família. Viu? Não tem mais aquela história de chefe de família. Mas na questão seguinte, eles pedem para que se foque em um só dos responsáveis para responder as próximas questões. Aqui em casa quem manda são as mulheres, por isso coloquei-as na frente dos homens.

Tinham perguntas prá lá de interessantes, como por exemplo se havia na casa alguma pessoa que foi embora do país até até 31 de julho desse ano. Ou se morreu alguém que morava na casa até 31 de julho também. Será que é uma armadilha para o ex-goleiro do Flamengo? Talvez não. Mas eu senti falta de perguntarem, além da escolaridade que já comentei ali em cima, sobre cultura. Coisas do tipo se vamos ao cinema, teatro, se lemos livros. Também gostaria que o governo perguntasse se as pessoas, principalmente as mulheres da casa, fazem exames médicos periódicos, e se em clínica particular ou no SUS. Mas acho que eles não gostariam de publicar estas estatísticas.

Demorou mas chegou a pergunta que eu sabia que haveria sem as respostas que eu tinha certeza que nunca seriam colocadas. Em determinado momento o questionário traz a seguinte pergunta:

6.04 Características do morador. A sua cor ou raça é:

Como respostas, apareciam:

1-Branca 2-Preta 3-Amarela 4-Parda 5-Indígena

Pô, meu! Apesar da minha filha dizer que ruivo é extra terrestre, que é descendente direto de neandertal e outras coisas que só filhas dizem para os pais, eu me considero da raça humana. E não havia humanos no questionário. Cor? Caramba, pergunta cascuda, para eliminar candidato. Cor de que? Da cueca? Não podia ser. Pele? Talvez. Mas branca é a cor da pele de finlandeses. Talvez não. Albinos, será? Sei lá. Acho que nunca vi uma pele de cor branca. Branca não era a lata daquela cerveja que agora é vermelha? (se pagarem eu coloco o nome) Tenho certeza que minha pele não é branca. Ela sobressai da camiseta que estou usando que é branca de verdade.

E preta? Será que existe pele preta? Não me recordo de ter visto. Ah sim. Uma vez em Buenos Aires vi uma recepcionista de um restaurante que tinha a pele quase preta. Argentino nunca miscigenou muito. Mas não. Não era preta a pele dela. Nunca vi uma pele preta. Minha pele também não é preta. Amarela? Tão brincando! Amarela é a cor da camisa da nossa seleção. Nem doente do fígado e muito menos orientais têm a pele amarela. A minha… bem, não é amarela, se bem que entre branca e amarela, talvez fique com amarela. Fiz um pontinho nessa opção.

Parda…parda…parda? Que cor é essa? Perguntei no Twitter para as mulheres que conhecem todos os tipos de cores, pois nós homens somos limitados. Nenhuma resposta. Passa essa, depois analiso novamente. E indígena, é uma cor? Será que o governo acreditava nos filmes de cowboys que diziam que os índios tinham pele vermelha? Hei… na real… e eles também não eram os maus não, hein! Sou ruivo, meus pelos são vermelhos, mas não posso considerar que sou indígena. Ou será que eles… a não ser que estivessem pensado no verão passado, que fui à praia e voltei com queimaduras fortíssimas. Não, não devem saber isso não. Definitivamente, também não sou vermelho, quer dizer, indígena.

Pardo. Vamos ao Google. Wikipedia: No Brasil, o termo pardo é formalmente utilizado para denominar aqueles que têm algum grau de miscigenação. Hehehehehe… não contavam com a minha astúcia. Respondendo na web eu pude colar e descobri, que como 99,999% dos brasileiros, sou miscigenado, portanto, sou pardo! :-)

Fechei o questionário. Recebi um código como recibo. Mas achei que foi fraco, deixou a desejar. Se eu fosse o governo perguntaria coisas muito mais interessantes. Ah, mas se eu fosse o governo, também faria muitas outras coisas diferentes.



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4 Comentários

  • Charles disse:

    Muito bom seu post. E como recenseador, convém comentá-lo.
    O primeiro Censo brasileiro ocorreu em 1872, que censeou a população. De lá pra cá, a população é recenseada e nós somos recenseadores. Este “re” indica que é uma atualização de dados.
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    Seu questionário tem poucas perguntas pois é o básico. O questionário completo vai para 11% da população (amostra).
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    Para saber as perguntas do completo, vá no site oficial do Censo 2010 IBGE, lá os questionários estão disponíveis em PDF para download.
    O questionário básico registra dados do domicílio, emigração internacional, moradores, falecimentos recentes, sexo, idade, etnia (cor ou raça), acesso a serviços públicos, alfabetização e renda. O questionário completo registra ainda escolaridade, religião, deficiência, migração, trabalho, nupcialidade (tipo de relação conjugal) e fecundidade (filhos gerados, vivos ou mortos).
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    Nós receseadores não recebemos vale-transporte e somos pagos por domicílio recenseado, não por tempo de trabalho.
    Logo, quanto mais temos que voltar numa casa, pior é. Por isto a insistência.
    E o questionário básico toma em média de 10 a 15 minutos, presencialmente. Por mais ocupada que a pessoa esteja, poderia dispor deste tempinho.
    Já o preenchimento via Internet tende a demorar o dobro, pois exige que a pessoa faça pré-cadastro (presencial), anote sua assinatura no coletor digital e receba a senha (em mãos). Tem gente que depois disso tudo, prefere continuar de forma presencial mesmo. Outros, internéticos fanáticos, como você, farão via Web (e consumirão mais tempo para conexão e para interpretar as perguntas). Para quem é muito ocupado, Internet não é boa opção.
    E mais, se você deixar uma só questão do preenchimento via Web em branco (ou sua conexão cair), o questionário é deletado e o recenseador terá que voltar em sua casa e fazer a entrevista desde o início. Por essas que o recenseador insiste na entrevista presencial.
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    No questionário básico, pergunta-se quantos sabem ler. Ou seja, medimos a alfabetização do brasileiro.
    Apenas na amostra pergunta-se detalhes como grau de escolaridade e nome do curso (se for graduação).
    Os dados sobre serviços públicos são espalhados pelos órgãos públicos das 3 esferas de governo, estatais e concessionárias privadas. E a medida é da oferta do serviço, não da demanda.
    É no Censo que o IBGE consegue medir precisamente a demanda e o real acesso da população a estes serviços. Perguntar sobre banheiros e esgoto é para medir acesso ao saneamento. E revelar desigualdades. Tem gente que não tem esgoto (vai tudo pro rio mais próximo). Alguns tem “uma casinha de privada” no fundo do quintal. Outros moram sozinhos numa mansão com 5 banheiros. E outros numa casa de praia com banheiros, mas o esgoto vai para o mar.
    .
    A renda é verificada em 2 campos (faixa e valor absoluto) para validar erros de digitação do valor.
    Já xinguei muito o pessoal de informática do IBGE que pede a faixa antes do valor, isso quebra a sequência da entrevista presencial.
    A usabilidade do sistema portátil é sofrível. Tenho que operar com aquela telinha mostrando uma barra de rolagem de 4 pixels e textos em fonte 8.
    .
    A pergunta sobre cor ou raça é na verdade sobre etnia. Já ouvimos respostas como “sou marrom bombom”, “moreninho”, “moreno jambo”, “branco pálido”, “róseo” etc. Mas nada disso é etnia. As opções, para fins estatísticos, são aquelas do sistema. Quem tem características predominantes do colonizador europeu é branco. Do africano é preto. Misto entre os dois é pardo. Ainda tem o indígena (nativo americano) e o amarelo (descendente de asiático). E é a pessoa que tem que declarar sua etnia, o recenseador não pode tirar conclusões ao observar o entrevistado.
    .
    Uma das análises é verificar se a responsabilidade sobre a casa é de uma ou mais pessoas. Já faz tempo que não existe o “chefe” único de família.
    Já a questão seguinte pede para escolher um dos responsáveis, mas daí o objetivo é medir laços de parentesco ou convivência. Um dos moradores vira então, a referência (e é esta a razão de se pedir o nome de cada morador).
    :D

    • Nelson Correa disse:

      Oi Charles!

      Um post sem um comentário igual ao seu nunca será um bom post. Esse agora ficou legal! Obrigado!

      Todos os tópicos que você esclareceu ficaram bastante claros para todos. Mas vamos comentar o tal de raça.

      O conceito de raça usado atualmente por biólogos nos principais centros pensadores do mundo, com respeito ao ser humano, é de que só existe uma raça humana.

      Quanto à cor de pele, é um conceito estapafurdio pois a tonalidade ou cor da pele pode variar em função da exposição ao sol em todos os seres humanos.

      No exemplo que você deu, sobre etnia, características predominantes e etc, podemos lembrar o caso do Neguinho da Beija-Flor, que tem pele de cor marrom escura mas seu DNA (o dele) tem 67% de origem européia e 31% de origem africana. Oh!!!!

      E aí, como fazer? No fundo, apesar da sua extrema boa vontade de ajudar a trazer a luz à discussão, nem você e nem mais ninguém do IBGE ou do governo consegue explicar ou justificar para que serve enfim, saber a cor da pele das pessoas.

      Eu só queria poder optar em não responder essa pergunta, pois não me sinto confortável de me auto-rotular.

      Muito obrigado pela visita e pelo fantástico comentário.

      Abraços e sucesso,
      Nelson

  • Enio Luiz Vedovello disse:

    Grande Nelson!
    Eu não sabia que havia a opção de responder o questionário pela net. Foi ótimo ler aqui e descobrir, pois duvido que o azulzinho consiga me encontrar em casa no horário dele…
    Abraços!

  • junior disse:

    No famoso recenseamento 2010, nenhum recenseador passou na minha casa(portanto minha familia não foi recenseada).Quanto ao famoso quesito “cor/ra-
    ça” do IBGE, não passa de um balaio de gatos, e como se sabe “todos os gatos são pardos”.Na verdade, todos os brasileiros são da Raça Humana
    e 99,9999999 por cento tem mistura de varias ori-
    gens: africanas, europeias,asiaticas, nativas americanas(de longingua imigração asiatica).O Brasil também conta com uma “elite” que o Darci Ribeiro considerava uma das piores do mundo.
    Atualmente fazem parte dessa elite muitos Pete-
    lhos e assemelhados e o povão de varias cores, origens, “etnias”, “raças”, “tribus”, “clãs” continuam com pessimo sistema de educação, saude,
    segurança publica e pagando impostos de Reino Unido com serviços publicos de India.

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